quarta-feira, maio 21, 2008

Zunái #15

Amigos,

Já está no ar a Zunái #15 - www.revistazunai.com.br - com

Toda língua é poesia, entrevista com a poeta canadense Erin Moure

Berlim, 1936; Pequim, 2008 (editorial)

Quando o olho é uma câmera e a mente edita imagens: poemas, textos, sons e imagens de cinepoesia

A poética sincrônica de Haroldo de Campos, ensaio de Cilene Trindade Nascimento

O vôo suspenso do tempo (sobre Walter Benjamin), ensaio de Maria João Cantinho

Rainer Maria Rilke e August Stramm traduzidos por Augusto de Campos

Chiyo Ni traduzida por Alice Ruiz

César Vallejo em videotradução e musicotradução

Carta de Lisboa, por Maria Alexandre Dáskalos

Contos de João Filho, Márcia Bechara, Greta Benitez, Silvana Guimarães, Bruna Piantino, ilustrados por Sônia Alves Dias.

Poemas de Jean-Paul Michel (França), Odete Costa Semedo (Guiné-Bissau), Alan Mills (Guatemala), Sérgio Rios (México), Joana Corona (Brasil), Carol Marossi (Brasil) e muitos outros.


Não deixem de visitar, está ótima!

terça-feira, maio 20, 2008

Wallace Stevens IV

DA POESIA MODERNA

O poema da mente no ato de encontrar
O que há de bastar. Não teve sempre
De encontrar: a cena estava armada; repetia o que
Estava no roteiro.
...................Então o teatro foi mudado
Para uma outra coisa. Seu passado um suvenir.
Tem de estar vivo, aprender a fala do lugar.
Tem de encarar os homens do tempo e encontrar
As mulheres do tempo. Tem de pensar na guerra
E tem de achar o que bastará. Tem de
Construir um novo palco. Tem de estar nesse palco
E, como um ator insaciável, lentamente e
Com meditação, dizer as palavras que no ouvido,
No delicadíssimo ouvido da mente, repitam,
Exatamente, aquilo que se quer ouvir, ao som
Do qual uma audiência invisível escuta,
Não a peça, mas a si mesma, expressa
Numa emoção como de duas pessoas, como de duas
Emoções tornando-se uma. O ator é
Um metafísico no escuro, tangendo
Um instrumento, tangendo uma corda tensa que dá
Sons que assumem repentina correção, de todo
Contendo a mente, abaixo da qual não poderá descer,
Além da qual não tem vontade de subir.
..............................................Tem de
Ser o encontrar de uma satisfação, e pode ser
Um homem patinando ou uma mulher dançando, uma mulher
Penteando-se. O poema do ato da mente.


(tradução: Paulo Henriques Britto)


(Wallace Stevens. In: Parts of the World)

Galeria Malevich IV: Avião voando

Kazimir Malevich, 1914

segunda-feira, maio 19, 2008

Wallace Stevens III

TREZE MANEIRAS DE OLHAR UM MELRO

I

Em vinte montanhas nevadas
Só uma coisa se movia:
O olho do melro.

II

Eu estava entre três opções,
Como árvore
Em que pousaram três melros.

III

O melro girava no vento outonal.
Era um figurante na pantomina.

IV

Um homem mais uma mulher
Dá um.
Um homem mais uma mulher mais um melro
Dá um.

V

Não sei se prefiro
A beleza das inflexões
Ou a das insinuações,
O assovio do melro
Ou o instante depois.

VI

O gelo cobria a longa janela
Com bárbaros cristais.
A sombra do melro
Cruzava de lá para cá.
E na sombra
Desenhou-se
Uma causa indecifrável.

VII

Ó homem magro de Haddam,
Por que sonhais com aves douradas?
Acaso não vedes o melro
A caminhar por entre os pés
Das mulheres que vos cercam?

VIII

Sei de nobres canções
E ritmos lúcidos, irressistíveis;
Mas sei também
Que o melro tem a ver
Com o que sei.

IX

Quando voou além de onde a vista alcança
O melro demarcou o limite
De um de muitos círculos.

X

Ao ver melros voando
Numa luz esverdeada,
Mesmo os cáftens da eufonia
Exclamariam espantados.

XI

Ele atravessava Connecticut
Num tilburi de vidro.
Certa vez teve medo:
Por um instante pensou
Que a sombra da carruagem
Eram melros.

XII

O rio está correndo.
O melro deve estar voando.

XIII

Era noite, a tarde toda.
Nevava
E ia nevar.
E o melro imóvel
Num galho de cedro.


(tradução: Paulo Henriques Britto)


(Wallace Stevens. In: Harmonium)

Galeria Malevich III: Suprematismo


Kazimir Malevich, 1916

domingo, maio 18, 2008

Wallace Stevens II

A CASA ESTAVA QUIETA E O MUNDO CALMO

A casa estava quieta e o mundo calmo.
Leitor tornou-se livro e a noite de verão

Era como o ser consciente do livro.
A casa estava quieta e o mundo calmo.

Palavras eram ditas como se livro não houvesse,
Só que o leitor debruçado sobre a página

Queria debruçar-se, queria mais que muito ser
O sábio para quem o livro é verdadeiro

E a noite de verão é perfeição da mente.
A casa estava quieta porque tinha de estar.

Estar quieta era parte do sentido da mente:
Acesso da perfeição à página.

E o mundo estava calmo. Em mundo calmo.
Em que não há outro sentido, a verdade

É calma, é verão e é noite, a verdade
É o leitor insone e debruçado a ler.


(tradução: Paulo Henriques Britto)

(Wallace Stevens. In: Transport to Summer)

Galeria Malevich II: Pressentimento complexo

Kazimir Malevich, 1928-1932

sábado, maio 17, 2008

Wallace Stevens I

DESILUSÃO DAS DEZ HORAS

As casas são assombradas
Por camisolas brancas.
Nenhuma é verde,
Nem roxa com bainha verde,
Nem verde com bainha amarela,
Nem amarela com bainha azul.
Nenhuma delas é estranha,
Com meias de renda
E faixas de contas.
Ninguém vai sonhar
Com caramujos e orangotangos.
Só um ou outro marinheiro velho
Bêbado dorme de botas
E pega tigres
Em dia vermelho.


(tradução: Paulo Henriques Britto)

(Wallace Stevens. In: Harmonium)

Galeria Malevich I: Branco sobre branco


Kazimir Malevich, 1918

sexta-feira, maio 02, 2008

Guido Cavalcanti II

Quem é esta a que toda gente admira


Quem é esta a que toda gente admira,
Que faz de claridade o ar tremular,
Com tanto amor, e deixa sem falar,
E cada um por ela só suspira?

Ah, Deus, como ela é, quando nos mira?
Que diga Amor, eu não o sei contar.
De tal modéstia é feito o seu olhar,
Que às outras todas faz que eu chame de ira.

Nem sei dizer do seu merecimento.
Toda virtude a ela está rendida,
Beleza a tem por Deusa e assim a exalta.

A nossa mente nunca foi tão alta,
Nem há ninguém que tenha tanta vida
Para alcançar um tal conhecimento.


(Guido Cavalcanti. In:Invenção)


(Tradução: Augusto de Campos)

quinta-feira, maio 01, 2008

Guido Cavalcanti I

Pelo olhar fere o espírito sutil


Pelo olhar fere o espírito sutil
que faz na mente o espírito acordar,
do qual se move o espírito de amar
que faz todo outro espírito servil.

Não o descobrirá espírito vil,
tal é o dom deste espírito sem par,
espírito que faz tremer o ar
do espírito que faz dama gentil.

E deste mesmo espírito se move
um outro doce espírito suave,
que um espírito segue de mercê.

O qual espírito espíritos chove
e dos espíritos conhece a chave,
por força de um espírito, que vê.


(Guido Cavalcanti. In:Invenção)


(Tradução: Augusto de Campos)